Os dois grandes ingredientes na cozinha e uma receita de guisado.

Cover art podcast Marinar.png

O podcast marinar já chegou.


Se vocês forem como eu, o tempo para estar sentada a ler é muito curto ou quase inexistente. Há sempre muitas coisas para fazer mas também uma vontade grande de nos mantermos conectados às coisas que gostamos.
Quando me apercebi que ouço podcasts enquanto conduzo, dobro a roupa e passo a ferro, percebi que, tal como eu, outras pessoas o farão. É mais um meio para vos fazer chegar informação relevante que de outra forma não teriam disponibilidade para obter.
Por isso, hoje é com muito orgulho que lanço o podcast Marinar que será um local para falarmos sobre organização, planeamento de refeições e orçamento familiar mas também um sítio com entrevistas de qualidade. 

Episódio #1
Os dois grandes ingredientes na cozinha e uma receita de guisado.


Neste episódio falo sobre os dois grandes ingredientes na cozinha, segundo a Nigella Lawson: tempo e dinheiro. Sobre como ambos afectam a maneira como cozinhamos e como tirar partido deles para tornar a nossa vida um pouco mais fácil. No final, partilho convosco a estrutura de um bom guisado e como poderão fazer um em casa, sem precisarem de receita.

Porque as melhores conversas acontecem à mesa, vamos sentar-nos a conversar? Estão convidados e se quiserem tragam um amigo também.

Show notes

Há coisa de um mês ouvia uma entrevista à autora de livros de cozinha Nigella Lawson no podcast The Bunker. Sendo uma leitora ávida dela, apressei-me para ir ouvir o que tinha a dizer. A certa altura, no meio da entrevista, a Nigella lembra que, na opinião dela,

“ só há dois grandes ingredientes na cozinha: tempo e dinheiro. “

Ela continua a ideia explicando que se não temos muito dinheiro, precisamos gastar mais tempo a cozinhar e que se temos muito dinheiro, podemos comprar ingredientes mais caros que não precisam de muito tempo para cozinhar.

Em poucas palavras ela conseguiu explicar um dos grandes pilares da cozinha de forma brilhante. A verdade é essa mesmo: um pernil de porco é uma peça de carne de baixo custo mas para a tornarmos deliciosa, precisa de ser marinada e assada lentamente no forno. Ao passo que uma costeleta ou um bife, bem mais dispendioso, frita-se ou grelha-se rapidamente.

Apesar de serem aparentemente antagónicos, é possível alternar entre os dois conceitos consoante as condicionantes que temos. Cá em casa as nossas refeições variam conforme o tempo que temos para cozinhar, os ingredientes que adquirimos, as sobras que temos disponíveis, os cabazes de 5 kg de courgetes que nos chegam dos nossos familiares e dos molhos intermináveis de couves no inverno. 

No fim-de-semana, quando tenho mais tempo, posso assar lentamente duas ou três doses de um guisado de carne pouco dispendiosa para ir consumindo ao longo da semana e até congelar algumas doses. Mas provavelmente a meio da semana irei grelhar umas postas de salmão ou uns bifes de frango dependendo do que tenho planeado e disponível em casa.

No entanto, acredito que ao termos um orçamento mais apertado tornamo-nos melhores cozinheiros, mais conscientes de como aproveitar todos os alimentos que temos. Aprendemos a marinar, a cozinhar lentamente, a usar ervas e especiarias para transformar o que já temos em algo diferente. Aprendemos a demolhar, a fermentar, a transformar as sobras e a aproveitar cascas e ossos para fazer caldos.

A prova disso foi o tempo que estivemos de quarentena. De repente as redes sociais encheram-se de fotografias de pão caseiro, de bolos e bolachas e de comida feita em casa, apesar de estarmos todos a aproveitar ao máximo os ingredientes que tínhamos em casa. Nunca como nessa altura recebi questões e telefonemas a perguntar como fazer massa mãe, dúvidas infinitas de como fazer pão, o que fazer para aproveitar meio pacote de lentilhas, maneiras diferentes de cozinhar a mesma coisa, o que fazer com as folhas das beterrabas, entre tantas outras. E a verdade é que para além de adorar responder a essas questões, estava maravilhada com o facto de as pessoas estarem a acordar para algo tão fundamental que é sabermos cozinhar para nós e reduzir ao máximo o desperdício.

Na cozinha é importante percebermos a diferença entre o que demora muito tempo a cozinhar e o que demora muito tempo a preparar. Porque muitas vezes, um guisado que demora duas horas a cozinhar, demora 10 minutos a preparar. Enquanto um salteado pode demorar 30 minutos a preparar  e a cozinhar. 

O meu tipo favorito de receita neste momento, enquanto mãe de uma criança pequena e que faz todas as refeições em casa, é aquela que é saborosa e que não precisa de babysitting. 

A estrutura de um bom guisado: darmos tempo a uma peça de carne pouco dispendiosa.

Ainda no assunto do tempo, quando damos tempo aos ingredientes para cozinharem, seja uma carne para ficar tenra no molho, um pão para dourar correctamente ou um rissol para fritar até ficar douradinho, estamos a dar oportunidade aos alimentos de desenvolverem sabor e textura. E isso para mim é parte fundamental da experiência de comer. E não se acanhem que para fazer um guisado delicioso não precisam de uma receita mas antes de compreender a estrutura do que faz um bom guisado.

Os princípios são simples:

  • Alourar cubos de carne em gordura, em pequenos lotes e reservar;

  • Triturar cebola, aipo, cenoura e alho e alourar na mesma panela;

  • Adiconar a carne e temperos e cobrir com líquido;

  • Deixar cozinhar lentamente por cerca de duas horas;

  • Opcional mas que faz toda a diferença: temperar a carne com sal no dia anterior e deixá-la à temperatura ambiente cerca de uma hora antes de cozinhar.

Então como faço um bom guisado?

Começamos com cortes de carne menos dispendiosos, normalmente de partes do animal que sejam músculos de força ou trabalho e consequentemente mais rijos. Um bom exemplo disso serão peito, coxa ou perna. Também conhecidos por cachaço, peito alto, chambão e pá. Mas não deixem que o preço ou o nome vos engane, estes cortes, apesar de mais baratos são geralmente mais saborosos. Precisam apenas que os tratemos de forma correcta: cozinhados a baixas temperaturas durante bastante tempo.

  1. Então, começamos por temperar a nossa carne com sal na noite anterior. O sal vai penetrar nas fibras da carne e torná-la mais suculenta e saborosa. Depois, cerca de uma hora antes de cozinhar, retirar a carne do frigorífico e deixá-la ficar à temperatura ambiente;

  2. Alourar a carne em azeite, banha ou outra gordura, ir fazendo por lotes. Alourar a carne vai, não só ajudar com o sabor mas também vai selar a carne e manter os sucos dentro, ficando a carne mais tenra;

  3. Picar ou triturar no robot de cozinha duas cebolas, dois talos de aipo e duas cenouras juntamente com dois ou mais dentes de alho. Alourar na gordura do tacho, raspando os pedacinhos que ficaram no fundo da panela - essa é uma das fontes de sabor do molho;

  4. Cozinhar esta mistura até alourar e depois juntar então a carne, líquido suficiente para cobrir os ingredientes (pode ser vinho, cerveja, caldo ou água) e duas a três colheres sopa de polpa de tomate - se tiverem e vos apetecer. Rectificar o sal, juntarem umas folhas de louro ou tomilho, colocar a tampa e deixar cozinhar em lume brando cerca de duas horas.

 Se preferirem, podem também fazê-lo numa panela de ferro fundido ou numa assadeira com tampa no forno, a 160ºC, durante o mesmo tempo. No final, se virem que o molho está mais líquido do que gostariam, deixem ferver destapado no fogão até o líquido reduzir.

E a melhor parte de tudo é que não só ficam com uma refeição deliciosa para esse dia como, estes guisados ficam deliciosos quando aquecidos no dia seguinte e prestam-se muito bem para congelar.

Numa semana difícil, é só retirar um destes tesouros do congelador e fervê-lo durante três minutos, acompanhado de uma boa salada, batata cozida ou arroz e uma fatia grossa de pão para molhar no molho. Como costumo dizer, ter comida feita no congelador é dinheiro no banco.

Bem, por hoje é tudo. Espero que tenham gostado e não se esqueçam que quero dar voz e incluir-vos nesta conversa, por isso mandem-me as vossas questões em formato de voz para marinaamarinar@gmail.com. Se conhecerem alguém que seria perfeito para eu entrevistar incluam a recomendação também no e-mail!

Se ainda não o fizeram, não se esqueçam de subscrever ao podcast para serem notificados dos novos episódios. Fiquem bem e até breve!